Tarifas em alta no gás canalizado: Desequilíbrio ou falta de explicação?

Por Cid Tomanik

Os recentes aumentos nas tarifas de distribuição de gás canalizado em diversos estados brasileiros têm chamado atenção de consumidores industriais, comerciais e residenciais.

Percentuais elevados nas margens de distribuição foram registrados em estados como Alagoas, Bahia, Espírito Santo e Rio Grande do Sul, trazendo de volta ao centro do debate a delicada equação entre expansão da infraestrutura, equilíbrio econômico-financeiro da concessão e modicidade tarifária.

No entanto, a discussão pública em torno desses aumentos ainda é marcada por certo desconhecimento técnico sobre os fundamentos regulatórios que os sustentam. Muitas vezes, a narrativa tende a sugerir que reajustes elevados decorrem de decisões arbitrárias, descoladas de qualquer lógica econômica ou contratual. É preciso ir além dessa leitura superficial.

A tarifa de distribuição de gás canalizado não é fruto da vontade unilateral da concessionária ou do Estado. Ela resulta de um processo regulatório fundamentado em modelos econômicos adotados por cada agência reguladora estadual, a partir dos contratos de concessão e da legislação local.

Nas revisões tarifárias periódicas, considera-se a base de ativos da distribuidora, os investimentos realizados para expansão das redes, os custos operacionais eficientes e a remuneração compatível com o risco do negócio. Trata-se, portanto, de um processo técnico, sujeito a metodologia, consulta pública e deliberação transparente.

É natural que, em ciclos de forte expansão de infraestrutura, as tarifas reflitam os novos investimentos. Isso não significa abuso ou excesso, mas sim a tentativa de garantir sustentabilidade ao modelo de concessão.

Por isso, ao observar aumentos tarifários expressivos, a pergunta correta não é “por que aumentou?”, mas sim “o aumento decorre de investimentos eficientes, prudentes e devidamente auditados?” e “a agência reguladora exerceu seu papel com rigor técnico e transparência?”.

Outro ponto recorrente nesse debate diz respeito ao papel das metas de universalização. O serviço de gás canalizado é, por definição, um monopólio natural concedido pelo Estado. E como tal, deve atender ao interesse público. Isso significa ampliar a rede, alcançar novas regiões, conectar mais consumidores e garantir previsibilidade no atendimento.

A expansão territorial das redes é parte do dever da concessionária, e os contratos preveem essa obrigação como contrapartida à exclusividade do serviço. O financiamento desses investimentos ocorre por meio das tarifas, dentro dos limites da modicidade e da eficiência regulatória.

Comparações internacionais muitas vezes são utilizadas como argumento para questionar o nível das tarifas no Brasil. É comum ouvir que o gás no país é mais caro do que em outros mercados das Américas. Embora haja verdade nisso, é impreciso concluir que a razão esteja exclusivamente na distribuição.

A cadeia do gás natural no Brasil ainda carrega altos custos de suprimento, forte carga tributária, limitações de infraestrutura de transporte e uma regulação estadual fragmentada. É preciso cuidado ao fazer paralelos internacionais sem levar em conta essas variáveis estruturais.

O debate público sobre tarifas precisa ser mais qualificado. É legítimo questionar aumentos, mas é necessário fazê-lo com base em critérios técnicos. O desafio está em construir um ambiente regulatório que assegure simultaneamente previsibilidade para os investimentos, expansão da rede de atendimento e modicidade tarifária para o consumidor.

E isso só será possível com agências reguladoras fortes, contratos bem estruturados, transparência decisória e participação social qualificada.

O crescimento do setor de gás natural no Brasil passa, necessariamente, pela consolidação de uma regulação madura. Tarifas justas não significam necessariamente tarifas baixas, mas tarifas que reflitam custos reais, investimentos prudentes e ganhos de eficiência.

A expansão da infraestrutura deve continuar, mas acompanhada de uma atuação regulatória responsável, com foco no interesse público e no equilíbrio entre todos os agentes envolvidos.

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